Conforme Marcos Arruda (2003, p.36) “educação de jovens e adultos (EJA) é coisa de países pobres ou empobrecidos. Ela existe porque existem excluídos, porque existem crianças cujo direito à educação foi negado pela própria condição de terem que usar sua infância para trabalhar”.
O pensamento do autor vem ao encontro de uma realidade secular. Com quase nenhum estudo, os jovens, adultos e idosos das camadas populares ficam sem opção de trabalho e se sujeitam a qualquer tipo de ocupação nas empresas de capital privado.
São presas fáceis de patrões exploradores que quase sempre subtraem os seus direitos por entenderem que poucos serão questionados por uma pessoa leiga e sem informações. Destaca-se também que quando a empresa entra em crise financeira os primeiros a serem demitidos são as pessoas com menos qualificação.
Na verdade, a EJA abre uma possibilidade para a educanda e o educando buscarem formação e conhecimento para lidar com os desafios que o mercado de trabalho lhes impõe no dia a dia. A referência da EJA, porém, passa a ser um conceito abstrato, porque rotula o “analfabeto” como aquele que não sabe ler e escrever. Abstrato, porque o coloca fora de seus contextos, como um ser sem história e sem relações.
Para a vertente da educação tradicional, a melhor proposta é alfabetizar o aluno considerando como um pote vazio de conhecimentos. No dizer do professor Paulo Freire (1977, p.41) nessa ótica “o educando é tomado como um pote vazio a ser cheio pelo professor, pelo livro, pelo saber acumulado, para depois pagar juros cumprindo a função prevista para ele na sociedade, concebida como uma grande máquina”.
Já os movimentos populares têm outra visão acerca do processo de alfabetização dos trabalhadores e, portanto, realiza também a inclusão do idoso no processo educacional. Dessa forma, deixam de defender apenas a educação de jovens e adultos (EJA) e passam a incluir os idosos, o que altera a sigla para EJAI, ou seja, educação de jovens adultos e idosos.
Outra coisa é o tratamento que a EJA dá aos seus educandos e educandas, onde a intenção é enchê-los dos conteúdos do saber socialmente construído, e uma vez alfabetizado, o sujeito contribuirá para o desenvolvimento social da comunidade.
Sob a perspectiva de Arruda (2003), jovens, adultos e idosos são pessoas que já carregam consigo décadas de trabalho e um extenso conhecimento do mundo, infelizmente, foram pessoas preparadas principalmente para o trabalho pesado, ou seja, a mão de obra com força bruta, os famosos e seculares trabalhadores braçais. Nesse contexto estudar está muito distante, e não é pauta principal, sua ocupação não é nem pode ser estudar, mesmo quando se esforçam e participam da EJA.
Então surge o dilema: a solução seria alfabetizar e, em seguida, escolarizar o jovem e o adulto trabalhador? O método seria “colar”, ou talvez gravar como muitos fazem? Sobrepor o conhecimento aos trabalhos que fazem na sua vida diária? Ou o objetivo seria “capacitar” o trabalhador para ele competir com maior chance no mercado de trabalho? Seria treiná-lo em conhecimentos que permitam competir melhor contra outros trabalhadores na busca de emprego?
Fazem-se essas perguntas para aqueles que tomam o mercado econômico em vigência como o único possível. Já que é quase impossível fazer diferente, dizem os especialistas e indicadores financeiros, é preciso se adaptar para sobreviver:
Na verdade, o ponto de partida não pode ser o analfabeto abstrato. É preciso partir da realidade do jovem e adulto trabalhador, o fato de que é hoje um trabalhador, lutando para construir um caminho ou para ajudar sua família na tarefa de produzir e reproduzir vida.
O ponto de partida é, portanto, o trabalhador concreto – se é homem ou mulher, jovem, maduro ou idoso, sua condição de vida e trabalho, sua história e seu saber acumulado, suas aspirações e seus anseios, seu universo de relações interpessoais, comunitárias e sociais. (ARRUDA, 2003, p.36).
Essa é a proposta do que Paulo Freire chamava de “Educação Libertadora”. Tomando como ponto de partida as condições de vida e trabalho dos educandos, o educador (FREIRE, 1967, p.16) abre um diálogo com eles sobre a questão “para que desejam educar-se”.
Fica logo evidente, por suas respostas, que suas aptidões para a educação estão vinculadas não a um desejo abstrato de “saber”, mas são pretensões concretas de como arrumar um trabalho melhor, para ganhar mais e melhorar a vida para si e para a família. Na consciência dos que vivem do seu trabalho, a vinculação entre trabalho e educação faz-se naturalmente, pela própria condição de ser trabalhador.
Uma resposta
Paulo Freire sempre visionário e além do seu tempo.